segunda-feira, 23 de março de 2015

O desenvolvimento humano através da leitura e da reflexão

Na nossa primeira aula de Conteúdos e Metodologia de Ensino de Língua Portuguesa II, a professora nos surpreendeu com uma atividade inusitada. No primeiro momento, pensamos que era uma pegadinha. Como ler um texto escrito em alemão?
Só com orientação da professora, e em grupo, foi possível reunir algumas pistas sobre o assunto e tipo de texto a que a atividade se referia. Depois do susto, em continuação à atividade proposta, refletimos sobre o significado de ler, não de uma forma simplista, mas em seu sentido mais completo. O que exigiu maior envolvimento com o assunto e, buscando responder inúmeras indagações, é que se tornou possível discorrer sobre o tema.
Em um sentido generalizado “ler” significa decodificar as letras para formar palavras. Contudo, após a realização da leitura da carta em alemão, foi possível perceber que não é apenas isso. Ler significa, na verdade, entender, dar sentido a algo. Para que, só então, aconteça a comunicação entre o leitor e o objeto de leitura. Sendo assim, para dar sentido a uma determinada leitura, precisamos recorrer a inúmeros recursos que dispomos, entre eles, algum conhecimento prévio sobre a língua escrita, sobre sua estrutura, sobre seus gêneros, etc.. Ou seja, fazer inferências para eliminar aquilo que supomos não ser o correto e nos aproximarmos da informação que estamos buscamos. E foi exatamente esse percurso que percorri no exercício proposto.
Essas conjecturas causam certo desconforto por não termos o domínio do código em questão e, mesmo com associações e reflexões sobre esta leitura, ela se torna uma tentativa bastante frustrante. Consegui com minha bagagem descobrir que a língua utilizada foi o Alemão – descartei o Inglês pela presença de acentos e optei pelo Alemão pelo tamanho das palavras e as terminações em “EN” –; que o gênero usado era uma carta eletrônica – pela presença do endereço eletrônico no cabeçalho do texto e considerei seu formato de carta.
Desse modo, concluí que as descobertas realizadas sobre a leitura foram positivas, no sentido de aprofundar o entendimento sobre o significado de ler; por mostrar que não precisamos dominar todos os códigos para realizarmos certa leitura; que o conhecimento que dispomos pode ser relevante para novas descobertas e, principalmente, ao selecionar materiais didáticos, precisamos avaliar se são coerentes com o entendimento de nosso alunado – não descartando seus conhecimentos, tampouco anulando os desafios que o mundo da leitura deve proporcionar para que realmente haja a realização da conquista a cada novo conhecimento.
A leitura realizada sobre “A importância do ato de ler” aprofunda a reflexão sobre o real sentido da palavra “ler” que, segundo Paulo Freire, surge na vida do indivíduo mesmo antes de seus primeiros contatos com a língua escrita. Ao contrário do que se pensava, o ato de ler não deve ser exigido ou esperado após o encontro do aluno com o mundo das letras, das palavras, dos textos, mas acontecer desde seus primeiros anos de vida, por meio de sua interação com o outro e o mundo, suas percepções, observações, descrições. Enfim, Freire nos ensina que toda experiência vivida é uma rica bagagem de leituras que a pessoa tem de si, do outro e de tudo que está à sua volta. Por isso, essa “leitura de mundo” não pode ser ignorada, mas sim aproveitada para as novas descobertas.
Essas aprendizagens são o ponto de partida para o desenvolvimento do alfabetizando no todo, pois aprender a ler formalmente implica compreender o que essa atitude significará e porque ela se faz necessária. Daí a importância de dar sentido a essa experiência, fazê-la viva, partindo do real, do que se viu, ouviu, sentiu... viveu.
Com base em Freire, posso afirmar que entender esse aspecto modifica completamente o comportamento daquele que ensina, já que deve considerar as vivências de seu aprendiz. Ter sensibilidade é um fator primordial nessa tarefa, porque significa muito mais do que a realização de um simples trabalho. Significa promover uma aprendizagem permanente, inquietante, instigadora que motive cada vez mais seu aluno a aprender e a continuar suas próprias buscas. Imprimir esse desejo ao educando implica devoção, constância, participação, amor, ou seja, princípios pedagógicos intensamente defendidos por Freire.
As tarefas do educador, que se embasa em princípios verdadeiramente pedagógicos, como nos explica Freire, deixam de ser apenas planejamentos, métodos, registros e avaliações e se tornam trocas diárias, repletas de prazer, em busca de resolver todas as situações problemáticas que a vida nos proporciona, nos tornando melhores, maduros, plenos. Em conformidade com o pensamento de Freire, o educador precisa ser e estar consciente de que seu papel é único e intransferível e de que ensinar a grafar ou decodificar uma letra, palavra ou texto pode ser feito por qualquer pessoa que talvez nem conheça todas as regras da Língua Portuguesa e suas subdivisões. O educador preparado e consciente precisa ir muito além de ensinar a grafia e os códigos, precisa ensinar o sentido amplo e complexo do ato de ler. E isso vimos que é possível, e não seremos os primeiros, pois o referido autor realizou esse trabalho, reformulou nosso papel, repensou a nossa prática e conquistou nosso respeito e admiração pelo êxito de suas descobertas e conquistas.
Refletir sobre o ato de ler longe do conhecimento e uso de técnicas não é confortável para nós, estudantes da área, por todas as intempéries que abarcam essa carreira. Mas, só em pensar que o mundo idealizado pode existir de fato e nossa participação é fundamental para que aconteça é, no mínimo, atraente para os que amam essa profissão, desafiadora e inevitável, como eu. Ao mesmo tempo em que causa medo, pela responsabilidade que temos, dá também a sensação de poder e encorajamento para persistir. E penso qual será minha sensação ao realizar um décimo do que o autor experimentou.
Caminho para os nove anos na área da educação e até vivi grandes momentos: o da descoberta pela vocação, o do amor pela prática, o de frustrações pelas atitudes dos demais participantes envolvidos, o da busca pela formação. Contudo, os que mais me provocaram foram os constrangimentos causados após leituras como essa. Leituras que me levam a repensar minhas atitudes em sala, as técnicas adotadas, as avaliações precipitadas, a falta de conhecimento sobre algo que deveria saber. É aqui que eu cresço, amadureço, modifico.
O desafio que me motiva a permanecer nesta caminhada vem do desejo de proporcionar aos alunos aquilo que não tive durante minha escolarização – sentido. Momentos importantes para a construção do ser no universo e do qual não tenho memória alguma, que tristeza! Ler a experiência de Paulo Freire em seu período de alfabetização me causa inveja, assumo. Mas não é só, também me encoraja muito a lutar e me prepara para ser uma profissional diferenciada com objetivos que se estendem para além de aquisições mesquinhas, me remetem à valorização da pessoa, enquanto indivíduo de direitos, como também deveres e minha meta é a de promover o equilíbrio entre esses dois conceitos cruciais, fazendo com que as crianças sob minha responsabilidade conheçam seus direitos e realizem por si só os seus deveres para, então, com autonomia, conquistarem seu espaço e desfrutar dele.
Toda conquista tem desgaste, embate, desequilíbrio, indagações levando ao pavor os atuantes na área da educação que “preguiçosamente” vão seguindo conformados em permanecerem apáticos, mesmo tendo à sua volta recursos capazes de transformar esse cenário de fracasso no ensino. Considerando que a vida em sociedade requer comunicação entre seus membros e que a comunicação requer conhecimento do código usado para que haja o entendimento entre ambos. Todos os envolvidos devem ter o domínio desse objeto para a concretização de seus objetivos. E isso é muito bem colocado nos textos lidos de Madalena Freire: “A aventura de ensinar, criar e educar” e “Importância e função do Registro escrito, da Reflexão”.
Segundo a autora, as ações de ensinar criar e educar são vistas como aventuras, porque requerem espírito desbravador por parte do docente que, inconformado à apatia de seu aluno frente aos conteúdos propostos, vê-se em constante desafio de promover um ensino eficiente e desejado. Para isso, ela norteia a prática do ensino-aprendizagem com todas as ações necessárias, não apenas para o êxito do aluno, mas também para a satisfação do professor em participar efetivamente dessa conquista.
Madalena Freire lembra a todo instante que as ações pedagógicas devem ser encaradas como instrumentos necessários para obtenção dos objetivos propostos, devendo ser utilizados em todas as etapas do ensino, ao contrário do que vimos no exercício “carta em alemão”. O exercício nos mostrou que se o professor desconsiderar completamente o grau de aprendizagem do aluno, revelará claramente a sua falta de sensibilidade que, notadamente não planejou aquela atividade e, consequentemente, fará uma péssima avaliação, e não levará o educando à aquisição de bons resultados.
Já em seu segundo texto, Madalena Freire nos convida, quase que “gritando”, para a responsabilidade da reflexão e do registro escrito, evidenciando sua importância durante todo o processo do fazer pedagógico. Tais ações são imprescindíveis no cotidiano do educador, por levá-lo a repensar sua prática, revelar as possíveis mudanças, diminuir as surpresas, fugir dos riscos, armazenar de modo concreto esses momentos que fazem parte da nossa história e trazem a possibilidade de movimento dentro desse contexto, demonstrando que refletir a partir dos registros implica estar em constante aprendizado por exigir cada vez mais conhecimento para sua ordenação e organização.
Para concluir, quero salientar que enquanto os textos de Madalena Freire eram lidos e discutidos em sala, relembrei os conceitos teóricos de Piaget, Assimilação e Acomodação, embora a autora tenha usado como base de seus estudos conceitos metodológicos de Vygotsky. Pelos seguintes motivos: quando nos deparamos com uma nova situação de aprendizagem, entramos em um estado de desequilíbrio, até que organizemos nossos conhecimentos anteriores para, só então, assimilarmos algo novo e retornarmos ao equilíbrio novamente, tendo dessa forma acomodado mais um aprendizado. Para nos aprofundarmos em um determinado conhecimento, precisamos do exercício, da repetição ordenada e organizada para que avancemos cognitivamente diante das novas dificuldades que vão se apresentando e, assim, nos tornemos capazes de correspondê-las. O que serviu para reforçar as diretrizes apregoadas pela autora, bem como para ajudar a entender as dificuldades que tivemos para realizar esta atividade de leitura, escrita e reflexão.

Edina de Oliveira (7º semestre Pedagogia PARFOR)

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