sábado, 28 de março de 2015

Leitura e escrita: a eterna busca pela luz do entendimento

Na nossa primeira aula de Conteúdo e Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa II, fomos instigados pela professora a fazer a leitura de uma carta em alemão, algo muito inusitado para nós.
Porém, durante o exercício de leitura do texto, o estranhamento foi dando lugar à curiosidade e, ao analisar com mais atenção, começamos a “garimpar” palavras semelhantes a nossa língua materna e caminhamos nesse sentido. Até nos deparar com a palavra “leite” que nos indicou cautela, ao somente lançar mão desse recurso estratégico, pois temos no nosso restrito conhecimento do vocabulário alemão que a palavra leite é bem semelhante à palavra “milk”, devido a uma famosa marca de vinho branco alemã que usa a palavra “milch”. Além de algumas outras palavras semelhantes ao inglês.
Ler não significa só decodificar o conjunto de letras e inferir sentido a partir delas, mas também trazer toda bagagem cultural e antecipações do que o texto vai tratar, pensando que ele está restrito a um tema, no caso da nossa atividade, um e-mail curricular, trazendo somente vocabulários alusivos ao seu objetivo.
Mobilizamos nossos reconhecimentos de língua materna e da língua universal e suposições das delimitações que um assunto traz, quase sempre não fugindo do lugar comum. Claro que um melhor conhecimento da língua alemã daria mais rapidez e fundamentação mais concreta de uma compreensão de leitura, mas mesmo não tendo estes instrumentos, chegamos ao mesmo objetivo pelo caminho das estratégias de leitura.
Paulo Freire, em “A importância do ato de ler”, reflete sobre a compreensão do ato de ler não esgotada na decodificação pura da escrita, seja na forma grafada ou falada, como mostram na linguística os estudos teóricos de Ferdinand Saussure sobre significado e significante. Freire enfoca a antecipação do conhecimento de mundo, a bagagem cultural que o indivíduo adquiriu durante sua vida.
No texto em alemão, buscamos garimpar na memória as semelhanças das palavras em nossa língua materna, e/ou numa outra que conhecemos e recriamos estes códigos semelhantes, com base no que já conhecemos previamente e, como num “quebra cabeça”, tramamos as peças que facilitam a compreensão do contexto, fazendo relações com o que deixem mais límpidas as nossas suposições, antes de nos embrenhar no texto, como diz Paulo Freire “o meu mundo imediato”.
Usamos a “garimpagem” no início da busca, mas sem notar que, ao longo do texto, a ação se torna um ato arqueológico, como descreve Freire, no seu texto sobre a importância do ato de ler, com base em suas experiências de vida. Não de uma forma vazia, partindo de um indivíduo para um receptor, e sim a construção do contexto e da compreensão vir do próprio universo do agente, expressando todas as inquietações de sua realidade.
O enfoque está na perspectiva da redescoberta cultural que faz parte da função humana, enquanto ator da prática na transformação do seu próprio mundo, e os desafios de descortiná-lo, utilizando o conjunto de ferramentas advindas do processo inerente ao ser praticante da observância instintiva, que é também naturalmente humana.
Já Madalena Freire, na Série de Seminários “Observação, Registro, Reflexão: Instrumentos Metodológicos I”, nos apresenta a arte de educar alicerçada no ensinar, criar e educar. A importância do registro do professor, agente que já passou pelo enfoque que vimos em Paulo Freire acima e a agora irá atuar como o escriba da sua prática e, por conseguinte, será o crítico de seu próprio fazer didático pedagógico. A politização da Educação engajada em métodos teóricos, trocando o ato de ensinar por fazer arte, o mesmo acontece com o de criar em dar ciência, e mais ainda, o de educar em fazer política.
Na sua prática de ensinar, o educador é o gerador da ciência da educação. A autora fala em dar forma aos nossos desejos “para desenvolver o esforço na educação do desejo que traz o germe da paixão”. Formatar não seria talvez o vocábulo adequado e sim outra que dê sentido à concepção Freireana do homem como ser inacabado, mas receptor e observador das transformações à volta do seu mundo e disposto a atuar nessa metamorfose.
Registrar as redescobertas faz parte imprescindível da construção da consciência pedagógica e política do educador. Criar suas práticas, dando assim vazão ao ato de fazer com o alicerce na reflexão, no verbal e não verbal. O educador é o sujeito-autor, educado para tal tarefa, que não é das mais fáceis, mas muito importante, como já afirmamos, na busca do conhecimento, seja na ação, interação e troca no processo de aprendizagem com outros educadores.
Permitir-se estar no mundo das lembranças e dar a elas um novo olhar crítico, trabalhando o pensamento, por meio da reflexão, faz com que o educador não seja um mero copiador de teorias e sim um agente irrequieto cheio de “por quês e porquês”, pois é capaz de ser agora um sujeito-pensante e produtor de memórias, tecedor do seu próprio fio, de sua história, pensamentos, teorias e práticas, ou seja, um estudioso da ciência educacional, na sua plenitude de observador, escriba, pensante reflexivo, avaliador e arquiteto de sua própria prática sociointeracionista.
Por meio das reflexões tecidas, nesta atividade, posso afirmar que a leitura e a escrita são para o sujeito lugares de eterna busca pela luz do entendimento. Ao mesmo tempo em que o conhecimento sacia as necessidades impostas pelo mundo letrado, faz com que saiamos da nossa área de conforto. É como a imagem da tempestade de areia no deserto, em que o caminhante tem dificuldades com a sua proteção sensorial natural. E, assim, lança mão de seus conhecimentos para enfrentá-la. 
Os registros são peças fundamentais, tanto nas lembranças, pois se transformam em bagagens que serão carregadas pela vida e utilizadas quando forem precisas, assim como a revisão escrita contínua e processual das práticas pedagógicas do professor. O profissional experiente sabe que caminhos e como trilhar com cautela e sabedoria, transformando o seu fazer educativo em frutos a serem colhidos por aqueles que estão sob sua responsabilidade e habilidades instrucionais.
Como conclusão, reconheço que a professora Rosana, ao nos propor esta atividade, que começou com a “leitura” da carta em alemão e terminou com uma síntese reflexiva, embasada em autores como Paulo Freire e Madalena Freire, teve a intencionalidade pedagógica de nos ajudar a desenvolver o pensamento crítico-reflexivo sobre nossa prática docente, que tem como preocupação nuclear o ensino da leitura e da escrita.

André Luiz Correa de Oliveira 
(7º semestre Pedagogia PARFOR)

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