terça-feira, 11 de outubro de 2016

Currículo, Didática e Multiculturalismo



O programa Salto para o futuro, da TV Escola, um canal do Ministério da Educação, abriu para a discussão o tema currículo e conhecimento. Tema extremamente relevante e atual para os educadores, profissionais em fase de formação e outros agentes que tenham este e a educação no Brasil, como seus objetos de estudo. 
Além dos apresentadores, para compor o debate foram convidados, Antônio Flávio Barbosa Moreira (Coordenador do Mestrado em Educação da Universidade Católica de Petrópolis - RJ, vice-presidente da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação e consultor da séria discutida e apresentada no programa), Vera Candau (Professora da PUC - RJ e Coordenadora do Grupo de Pesquisas sobre Cotidiano, Educação e Cultura da PUC - Rio), Luiz Antonio Cunha (Sociólogo e Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Logo no inicio do programa, foi apresentada uma matéria do quadro Mosaico que mostrou a opinião de seis pesquisadores na área educacional sobre os desafios que se encontra na hora de compor o currículo, sendo citados os seguintes pontos, parafraseados logo abaixo:
Segundo Alfredo Veiga Neto, professor da UFRGS, o desafio estaria em dois eixos principais, um composto pelas rápidas mudanças que há na contemporaneidade e o segundo seria levar em consideração a heterogeneidade que há no Brasil.
Para Maura Corsini, professora da UniSinos, o primeiro desafio seria a multiplicidade que existe na escola, as diferenças e diversidades, o segundo seria trabalhar as disciplinas com o cotidiano da escola.
Elba Sá, professora da USP, apontou que o principal desafio está relacionado com a melhoria da qualidade do ensino, uma qualidade que não seja medida apenas pela eficiência e eficácia através de testes, mas que leve em conta a possibilidade de desenvolvimento do indivíduo e de uma participação ativa e plena na sociedade.
Alda Junqueira, professora da PUC - SP, diz que, em primeiro lugar, precisa-se entender o que é currículo, em segundo que esse seja estudado nas escolas e em cursos de formação de professores, por fim que haja produção de material sobre o currículo para uso de professores e alunos em cursos de formação de professores.
Nereide Saviani, professora da UniSantos, aponta que igualdade de condições na negociação curricular para os professores é o principal desafio.
Jane Felipe, professora da UFRGS, diz que está em incluir uma formação de professores adequada, competente.
Ao iniciarem o debate, o professor Antonio Flávio deu sua opinião sobre a não compartimentalização do conhecimento, visto que é um desafio para a organização do currículo.
Parafraseando suas palavras:

A não compartimentalização é um desafio porque o professor tende a executar o seu trabalho de forma solitária, quando os problemas na sociedade não são desenvolvidos da mesma forma. Portanto, seria interessante desenvolver um trabalho disciplinar e interdisciplinar isso exigiria da escola um esforço para gerar uma integração entre disciplinaridade e interdisciplinaridade, e trazer o diálogo entre os professores para romper esta não compartimentalização, ou seja, no currículo precisaria existir o momento de se trabalhar a disciplinaridade e momentos para trabalhar a interdisciplinaridade, rompendo a compartimentalização. A pluralidade também foi tema. Vera Candau argumenta que a cultura escolar foi constituída com base no que é comum, no uniforme, e hoje em dia, estudos mostram que são muitas as pluralidades existentes na escola. Diz também que infelizmente a escola não demonstra estar preparada e é um tema não muito presente na formação dos educadores. Então, segundo suas palavras, a escola precisa aprender a lidar com o comum e o plural, com a igualdade e a diferença.

O Sociólogo e também professor universitário Luiz Antonio Cunha opinou sobre a articulação de tempo e espaço, que é um desafio, pois o espaço da escola em muitas áreas no Brasil é improvisado. Abordou que a escola é uma projeção de outros lugares. Historicamente a escola se desenvolveu a partir do que era possível, e as horas investidas na educação percebe-se que não são suficientes.
Houve uma indagação feita quanto à diversidade cultural local, em breves palavras, Moreira afirma que considerar a diversidade local é muito importante, a criança traz a sua vivência cultural para a escola e acaba, por muitas vezes, forçada a deixá-la do lado de fora. Isso precisa ser trabalhado pela escola, esta precisa aproveitar a cultura local para desenvolver seus conteúdos.
O multiculturalismo e os direitos humanos, embora por muitos educadores sejam considerados questões muito complexas, foram postos em debate. A Professora Vera Candau concordou que se tratam de questões complexas, porque existem diferentes abordagens do multiculturalismo. Propôs que precisamos aprofundar o conceito do tema multiculturalismo. Segundo Caudau, a grande questão entre os direitos humanos e o multiculturalismo está em articular a igualdade e a diferença, o comum e o relativo. Moreira acredita que a escola precisa desenvolver uma postura quanto ao multiculturalismo e procurar entender que esta complexidade na sala de aula, embora dificulte, pode enriquecer o trabalho.
A relação entre currículo e planejamento também foi tema da entrevista, Moreira afirma:

Bem, o planejamento é uma parte essencial do currículo e da escola, né? As atividades que ocorrem na escola são dominantemente planejadas e supervisionadas por ela, o currículo não pode ser aleatório, não pode ocorrer de qualquer modo, é preciso que as experiências que se realizam no âmbito do currículo, é preciso que os conhecimentos que se ensinam, sejam todos eles pensados, sejam todos eles planejados previamente. Agora, é claro que aí também é importante acentuar que esse planejamento não pode jamais ser rígido, esse planejamento precisa estar aberto para inovações, mudanças que vão surgir no decorrer da sua implementação.

Falando ainda de planejamento foi questionado, até que ponto a flexibilidade do currículo é permitida no planejamento do professor?
Cito as palavras de Candau:

Olha! Eu acho que a flexibilidade tem que estar sempre presente, quer dizer, não existe... Na possibilidade você tem um planejamento escolar rígido, né? Eu acho que a flexibilidade é inerente ao planejamento, porque no dia-a-dia, o professor tem que estar continuamente adequando esse planejamento as situações e as realidades que ele vai enfrentar, um aspecto que eu gostaria de acrescentar, em relação ao planejamento, é a importância também, do planejamento coletivo, eu acho que as escolas que tem avançado mais no seu Projeto Político-Pedagógico, são escolas que têm espaços coletivos de planejamento, muitas vezes dos professores de uma mesma área curricular, ou, de uma mesma disciplina, e outras vezes de todos os professores de um mesmo ano escolar, eu acho que é muito importante a escola garantir esse espaço dentro do horário do professor, dentro da sua carga horária, né? Um espaço de planejamento coletivo. Eu acho que isso é fundamental.

Podemos notar que o currículo atualmente enfrenta questões, no que tange ao macro de sua estrutura, ou seja, ainda temos questões que precisam ser refletidas e socializadas e que são comuns a todo o território nacional: como entender e atender os alunos como indivíduos que carregam suas culturas locais para dentro da escola, estruturando um currículo bem planejado, flexível, que leva em consideração a liberdade de negociação do professor e que busca a não compartimentalização das disciplinas, mas que aplique seus conteúdos de maneira disciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar?
A E.B Beatriz de Souza Brito, localizada em Florianópolis - SC, foi mencionada em uma matéria sobre disciplinaridade e transdisciplinaridade, no programa Salto para o futuro, onde alunos exercitam a leitura na aula de Geografia. Isso é um bom exemplo de que é possível trabalhar, de modo que as disciplinas e as habilidades exigidas para os diversos conteúdos ensinados em sala de aula conversem entre si, agregando ao aluno uma vivência diferenciada, e consequentemente associando seu aprendizado ao cotidiano.
Além de o currículo ser tema de discussão, em cursos de formação de professores, outro tema presente e tanto quanto relevante é a Didática e os processos de aprendizado, uma vez respaldado no currículo, no planejamento, e diretrizes educacionais, o professor terá um papel diferenciado no aprendizado dos seus alunos, podendo ser um grande incentivador, entre o conhecimento e os alunos, assim como é de sua responsabilidade proporcionar e planejar instrumentos que lhe permitirão acompanhar o rendimento e autoavaliação de ambos, dados que poderão ser úteis para o professor, alunos, responsáveis, secretária e outros agentes educacionais.
Mas fazendo apontamentos sobre a Didática em si, e sobre a sua trajetória no Brasil desde a ditadura, encontramos muitos agentes envolvidos, Professores que enfrentaram muitos desafios e que persistem em sonhar com dias melhores para a nossa educação.
Temos como exemplo o 18º Endipe - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino, que ocorreu em Cuiabá – MT, em agosto de 2016. Maria Isabel de Almeida, professora da USP, nos reporta a longa jornada que está por traz desse evento, parafraseando as palavras de ALMEIDA:

A partir dos anos 70 começou um movimento no Brasil, em resposta à ditadura que teve inicio em 1964, então se procurou pensar, ou melhor, repensar sobre a democratização, mas também em fazer melhorias nas salas de aula, da didática, das práticas de ensino. Muitos de seus colegas, Professores Universitários das disciplinas de Práticas de ensino, de diversas áreas, a partir de 1979, e no começo dos anos 80, se reuniram.

Os professores entrevistados reportaram as dificuldades que precisaram superar para dar continuidade aos seus estudos, em nível de pós-graduação.
Naquele período, os professores não encontravam o apoio, ou a estrutura de hoje para conquistarem seus diplomas. Havia uma tensão político-social, sob a qual os professores eram investigados, questionados e podiam ser afastados da sala de aula, dos setores públicos, se não estivessem a favor da ditadura.
Os professores sofriam uma limitação didática imposta pelo governo, conforme o depoimento de Maria Amélia do Rosário Santoro Franco, professora da UniSantos:

Então 79, pra mim, é isso, então não podemos esquecer, nós estamos no momento de ditadura e o tecnicismo adentrando totalmente na questão do ensino. Então, nós tínhamos a limitação política do que se falar, o que se pensar, e o como fazer, e esta limitação também da técnica pela técnica, então, se eu falei que o Comenius me botou pra pensar didática sempre assim... É uma reflexão que requeria um método... Agora não, era uma técnica, nem método seria e a reflexão terminada, então em 79 veja, eu dava aula nos cursos de Pedagogia, e a observação, o que se pretendia, é que eu ensinasse meus alunos a fazer instrução programada do ensino, quer dizer, picasse o ensino em pequenas frases que pudessem caber numa máquina, que pudessem caber num verbo, tinha que ser aquele verbo, o aluno ou só vai definir, ou ele só vai identificar. A vida, a relação, as relações de pensamento, a crítica, a reflexão, totalmente banida dos processos de ensino, e, portanto, dos processos de aprendizagem. Então em 79, como me vejo? Me vejo, extremamente, ainda, angustiada.

Maria Isabel de Almeida afirma que, ao longo dos 37 anos de história do Endipe, esse evento conseguiu estabelecer uma articulação com o campo educativo, através da discussão, das múltiplas dimensões do fazer, do ensinar dentro da escola.
Para a Professora Yashie Ussami Ferrari Leite, UNESP:

Pra gente que trabalha com formação de professores, todas as definições políticas, elas têm tentado avançar dois passos e recua cinco passos. As condições salariais, as condições de trabalho dos professores estão cada vez mais precarizados, o alunado tem demonstrado um resultado muito ruim no sentido do sucesso pedagógico. Pra onde vai à educação? Eu acho que nós temos assim, uma frente de lutas de uma complexidade grande de fatores muito diferenciados, mas eu não quero perder a utopia ou a esperança de que a escola possa se constituir de uma forma melhor, e que a educação tenha que cumprir uma função política, oferecendo a todas as crianças realmente uma educação de qualidade que lhe dê condições de cidadania mais digna.

Vendo que embora tenhamos passado o período de ditadura no Brasil, ainda vivemos resquícios, a democracia não parece estar funcionando como deveria, os recursos não são destinados corretamente aos seus fins, a educação está em processo de amadurecimento e sofrendo com os rumos que impõem a ela.
Mas sem perder o fio da meada e retomando o assunto, Didática, o que significa essa palavra então...
Didática, segundo Marilda Aparecida Behrens, PUC-PR:

A didática na realidade é o eixo norteador da formação docente, ela tem o papel de articular a concepção e a discussão das abordagens, da ação pedagógica do professor e bem como instrumentalizar o professor pra uma organização do trabalho docente, qualificado, significativo, que leve esse aluno a aprender.

De acordo com Professora Suzana dos Santos Gomes, UFMG, Didática e prática de ensino são espaços propícios para estudo, pesquisas, troca de experiências sobre os processos educacionais em todos os níveis de ensino.
Observando as citações acima, podemos notar que a Didática é de extremo significado para que o professor cumpra com o seu papel. O professor que é didático consegue ensinar um conteúdo que aparentemente seja complexo, de maneira clara e facilitadora.
Quando pensamos no currículo, podemos ver que muitos são os agentes envolvidos para torná-lo possível, no entanto para que seja eficaz, a Didática precisa ser considerada.
Durante os vídeos, observei os esforços para trabalhar com flexibilidade, não compartimentalização, disciplinaridade, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade, aproveitar a cultura local para desenvolver o conteúdo de modo significativo, multiculturalismo, etc.. São termos didáticos ou que visam facilitar a mesma. Ou seja, a Didática, juntamente com a prática de ensino, irá nortear o trabalho do professor e influenciar diretamente a composição e a implementação do currículo.

Referências Bibliográficas:

ENDIPE 2016. 28'00". Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=6IWS15WpYQQ>. Acesso em: setembro de 2016.

SALTO PARA O FUTURO - CURRÍCULO ESCOLAR. 48'56".
Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=elqdmXCGVAw>. Acesso em: setembro de 2016.


Jorge Lucas Carvalho Galdino de Aguiar
Letras 2º semestre/2016

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