sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Currículo e Didática: o multiculturalismo brasileiro



O Brasil é um país com muitas diferentes facetas, culturas e diferenças que se devem tanto ao contexto histórico, como ao contexto social. Portanto, uma das principais questões que envolve a área do currículo hoje é o tema do multi-interculturalismo. Como é possível integrar todas as diversidades de todos os alunos em um currículo? Como se pode tomar em consideração todas as características de cada indivíduo? 
Estas questões devem preocupar os professores, enquanto estabelecem um currículo escolar. Como disse o professor Alfredo Veiga Neto (UFRGS), é importante lidar com a heterogeneidade da sociedade brasileira no âmbito da educação e isso implica também que esta discussão esteja presente na formação dos professores. 
Como averígua bem a professora Alda Junqueira (UFRGS), no momento de formar professores é de grande importância incluir a realidade social brasileira com todas as diversidades para garantir uma formação adequada e competente. Como seria possível confrontar-se com o multiculturalismo nas escolas se nem os professores tivessem conhecimento sobre esta discussão? Então, antes de tudo, como observa bem o professor Antônio Flávio Moreira, é necessário que se desenvolva uma postura por parte dos docentes, em relação à necessidade de compreender que a complexidade do multi-interculturalismo pode enriquecer o trabalho.
É um grande desafio relacionar a diversidade com o currículo, porque o espaço escolar foi construído na base do que é comum e se considera a escola como algo uniforme. Portanto, a ênfase está, ou estava, sempre no comum, como diz a professora Vera Candau (PUC-Rio). Apesar disso, esta questão está ganhando mais e mais importância, mas nem a escola, nem os professores estão preparados para esta transformação.
Outra grande discussão abrange o trabalho em relacionar a diversidade com o conhecimento e, ainda por cima, garantir uma qualidade boa. Aqui se pode colocar a questão da importância. O que é mais importante para uma educação qualitativa, a cultura ou o conhecimento? Mas a chave não está em escolher um ou outro, mas sim em inter-relacionar as duas discussões para poder elaborar um bom currículo.
Em resumo, o grande desafio consiste em como articular o comum com o plural e a igualdade com a diferença. A sociedade brasileira, como afirma Vera Candau, deveria sensibilizar-se para a importância da relação entre igualdade e individualidade, não somente para uma democracia escolar, mas também para autenticar a democracia do país. O trabalho não consiste somente em respeitar e reconhecer a multiplicidade e assim se esquecer da individualidade. É preciso encontrar um caminho para equilibrar a questão do multiculturalismo com os direitos humanos, que focalizam as questões da liberdade, individualidade e universalidade. Para a sociedade brasileira de hoje, não basta estabelecer um currículo escolar baseado no conhecimento, no comum, é preciso integrar a realidade social, que é a diversidade.
Ampliando a discussão para a área da Didática e analisando-a historicamente, foi possível compreender, por meio dos depoimentos de importantes pesquisadores brasileiros que participaram do Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino, em Cuiabá, em agosto de 2016, o retrocesso que a educação brasileira sofreu no período ditatorial. A ditadura militar começou em 1964 e durou até 1985. A partir dos anos 1970, grande parte dos educadores brasileiros começou a manifestar-se, quer dizer, empenhou-se em uma luta não só para democratizar o país, mas também para democratizar as salas de aula, as escolas e as faculdades. As comunidades didáticas e das práticas de ensino começaram a organizar seus primeiros encontros, denominados ENDIPE. Esta história bastante longa e significativa tem o seu início em 1979, quando as comunidades começaram a refletir sobre como se podia superar os limites rígidos impostos pela ditadura militar.
Nas décadas dos anos 70 e 80 havia poucos mestrados e pós-graduações e não existiam doutorados como existem hoje em dia. As pessoas que quisessem se doutorar poderiam se inscrever no Conselho Estadual da Educação, arranjar um orientador e fazer a sua tese, mesmo sem ter uma pós-graduação.
No âmbito público da educação era muito difícil de trabalhar, por causa de uma greve histórica quando Paulo Maluf era governador de São Paulo. Do ponto de vista do professor Eduardo Terrazzan (UFSM), isso foi o marco para a decadência da educação pública nesse estado, porque achataram os salários e a greve não trouxe a vitória esperada. 
Por causa da ditadura militar, estabeleceram-se também interdições em relação à ideologia política. Quer dizer, quem não atuava da maneira esperada pelo Governo (participação em movimentos políticos etc.) poderia acabar sendo afastado da universidade, como foi o caso do professor José Carlos Libâneo (PUC-GO). Ele foi afastado da universidade porque acabou sendo interrogado pelo serviço de informação. Teve uma ficha suja nos arquivos do Serviço Nacional de Informações, por ter participado de movimentos políticos. No ano de 1979, não houve muitas perspectivas na sua vida, mas um ano mais tarde, em 1980, foi beneficiado pela anistia, podendo voltar a estudar.
Ao longo daqueles anos, a partir de 1979 até hoje, houve uma consolidação de um espaço político-educacional que hoje é reconhecido nacionalmente e internacionalmente. Pode-se destacar, então, que desde o período da ditadura militar até hoje se tem feito grandes progressos no âmbito educacional, em relação à democratização e estabelecimento de escolas, possibilidades de pós-graduações e doutorados. Ainda assim, falta muito até que o Brasil tenha o sistema educacional desejado que envolva todas as necessidades dos professores, dos alunos e da sociedade. O país está numa situação difícil e precária e o trabalho de estabilização da educação já é um desafio em si, quer dizer que agora vai ser ainda mais complicado. Por esta razão é de suma importância o povo se manter unido, olhar para o futuro com um pensamento otimista e ir de mãos dadas.
Na minha opinião, a relação entre o Currículo e a Didática é a colaboração, quer dizer que o planejamento do currículo e a teoria da aprendizagem, na sala de aula, devem ser compatíveis com a prática. A essência de uma boa aula está em desenvolver de uma forma clara e compreensível o que expressa a teoria. Portanto, existe uma interdependência entre estas duas questões. O Currículo escolar não tem valor, se não puder se transformar na prática e ao contrário é valido dizer o mesmo. A teoria e a prática devem se fundir por meio do professor. Fundir ao saber ensinar, dialogar com a sociedade em relação a todas as suas múltiplas facetas (diferenças, diversidades, multiplicidades etc.)
Penso que em muitas profissões, não somente relacionadas à educação, a teoria nem sempre coincide com a prática, porque o ser humano não é capaz de estabelecer uma teoria fixa para um mundo que está em constante mudança. A vida, o homem estão sempre mudando, as situações cotidianas não são sempre as mesmas, em resumo, a cada dia nós temos de enfrentar novos desafios e surpresas que a vida nos traz. Exatamente por isso, é de suma importância criar um espaço para a flexibilidade, tanto no Currículo como na prática. É um trabalho muito difícil relacionar todas as questões que abrangem uma sociedade e embrulhá-las numa teoria que se opõe a esta mudança. Em verdade, nos encontramos ante a uma contradição e isso é o que causa estas discussões e dificuldades na área educacional.

Nadine Siegrist - Letras 2º semestre/2016

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